A peregrinação

                   Enquanto se preparava para a longa viagem à Meca, o comerciante se despedia de sua mulher e de seus inúmeros filhos.
                   -Filho, você agora é o homem da casa-dizia ao mais velho-Vigie bem esses empregados e mantenha a sua autoridade sobre eles.Não se pode confiar nesse povo.
                   -Tá.
                   -Tchau papai-dizia os pequenos.
                   -Tchau crianças.Mas não se preocupem porque daqui a uma semana papai vai estar de volta para ficar só com vocês- disse fazendo um cafuné na cabeça de cada um.
                   Dirigiu-se a sua mulher e disse rispidamente:
                   -Tchau amor.- e se beijaram rapidamente.
                   -Cadê o criado?-ao gritar e não obter resposta, xingou baixo e disse-Esse povo...não agradece pelo que tem.Você dá a mão e querem o braço inteirinho!Vou lá pegar o cavalo.- e saiu com a sua sacola de mantimentos.
                   No caminho ouviu um som que parecia de trombetas.Era estranho porque só ouvia-se aquilo na cidade.Morava em uma espécie de oásis.Fizera fortuna.Era um comerciante próspero.Por isso ia à Meca várias vezes ao ano.Já tinha levado a sua família este ano.Tinha uma amante também lá.Certamente estaria de barriga cheia.Com quantos meses deve estar?Será um menino? pensava até que se encontrou com o empregado que descansava debaixo de uma árvore.
                   -Por que não me ouviu?disse gesticulando expressivamente-É pra isso que te dou parte da minha comida e teto.Vá buscar o meu cavalo.
                   Esperou e esperou até ele chegar.
                   -Já era hora!-já bravo.
                   Ao montar no cavalo e depois de tudo pronto seguiu.
                   -Não vai querer que o outro vá com o senhor?
                   -Está a ouvir isso?-ouvia de novo o som de trombetas...
                   -O quê?
                   -Não?Acho que você é de fato surdo- e seguiu-Não precisa dessa vez.Vou eu mesmo-não queria corer o risco que soubessem de sua outra vida.Sua mulher já estava desconfiada.Nunca haviam brigado tanto ultimamente.Ela chegara a loucura de proibí-lo de viajar!Que insulto!-pensava-Depois de tudo que lhe dei.
                   O barulho ia ficando cada vez mais ensurdecedor.Mal sabia ele que naquela imensidão de areia nada era deserto e caminhava rumo a um labirinto sem saída cujo poder de mudança ele nada possuía.
                   E o vento apagava os seus rastros...